Doação só a mercado? Mais um tema polêmico será decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em repercussão geral, tendo seu resultado afetando todos os outros casos semelhantes pelo país: se as doações de bens e direitos em adiantamento de herança legítima devem ser tratadas como se fossem a valor de mercado e se a diferença entre o valor de custo e o valor de mercado será tributado ou não pelo Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF).
A discussão surgiu porque a Receita Federal passou a cobrar/exigir o IRPF sobre o valor do ganho de capital apurado entre a diferença do valor de mercado do bem transmitido e o valor de custo do bem registrado na declaração do doador (junto com o imposto sobre doação – devido aos Estado e ao Distrito Federal), quando os herdeiros legítimos, que são aqueles que têm direito a herança por lei, recebem por doação parte dos bens que receberiam por herança.
Os contribuintes não concordam com essa posição do Fisco. No processo que deu origem ao Tema nº 1.321/STF (RE nº 1.522.312/SC), o contribuinte se opôs judicialmente à cobrança do IRPF sobre o ganho de capital originado de uma doação com a finalidade de adiantamento da herança legítima, prática muito comum utilizada em planejamentos patrimoniais e sucessórios.
A origem da discussão é uma sobreposição de previsões legais.
Por um lado, o artigo 23, § 1°, da Lei nº 9.532/1997, autoriza a exigência de IRPF sobre o ganho de capital obtido quando da transferência de propriedade por doação em adiantamento da herança legítima se o doador optar por realizar essa transmissão a mercado. O Fisco Federal defende que há ganho de capital na diferença entre o valor de mercado do bem transmitido e de seu custo de aquisição pelo doador.
Por outro lado, o artigo 6°, inciso XVI, da Lei nº 7.713/1988, prevê que os bens transferidos por doação são isentos de IRPF. O racional se justifica pela impossibilidade de o mesmo fato (doação) ser tributado tanto pelo ITCMD e como pelo IRPF, sob pena de bitributação.
O tema é controverso entre as Turmas do próprio STF e, apesar de haver decisões favoráveis aos contribuintes em julgamentos anteriores, ainda não é possível prever com segurança qual será o resultado do decidido em repercussão geral.
A futura definição do entendimento pelo STF sobre o tema representará um grande passo para a segurança jurídica, uma vez que, ao menos, haverá a certeza de que todos os casos idênticos terão o mesmo desfecho, trazendo tratamento isonômico a todos os contribuintes.
Diante desse cenário, é importante ter atenção nas doações em adiantamento de herança já realizadas e a serem realizadas, avaliando a necessidade de discussão judicial sobre o tema a fim de se resguardar contra futura modulação de efeitos (a ser decidido pelo STF), eventualmente exigindo pagamento do IRPF sobre as doações.
Por Júlia Dias, advogada de Candido Martins Cukier Advogados.